quinta-feira, 22 de setembro de 2011
terça-feira, 20 de setembro de 2011
ALFA E OMEGA
Ver Deus no outro. Deus belo ou Deus feio, poderoso ou débil, democrático ou déspota, acolhedor ou perseguidor, amoroso ou iracundo. Na face da mãe que chora a perda do filho para as drogas, ver o Deus que consola. Na lida diária e escravizante do pai que madruga para garantir o pão, e somente o pão, para a família, ver o Deus que renova as forças. No abraço sincero e afetuoso de amigos que se encontram após longo tempo, ver o Deus Emanuel. No beijo reverente, porém erótico, dos amantes que sentem suas entranhas em chamas, ver o Deus que fez e se fez corpo. Deus sendo plasmado nos gestos daqueles que foram criados à sua imagem e semelhança.
“Ninguém pode amar a Deus a quem não vê e odiar o irmão a quem vê… este tal é mentiroso”. É nesta equação simples que o apóstolo João resume nossa busca por Deus. Mirar os olhos para o céu e verticalizar nossa busca pela divindade só nos levará a encontrar a nós mesmos. Na ausência de concretude para nossa busca, vamos preenchendo as lacunas com nossos conceitos e desejos até construirmos um deus que seja a nossa cara; portanto, um ídolo. É importante atentar para o começo do processo de conhecimento. Não se começa pelo que está lá fora para depois tentar encontrá-lo aqui dentro. Se assim procedermos só encontraremos nossas projeções.
A busca é sempre dialética. Deus em nós, conosco e por nós. A divindade repousa misteriosamente em nosso interior, ganha cheiro e fisionomia entre aqueles que estão à nossa volta e finalmente adquire densidade e plenificação no mistério da transcendência. Assim como não podemos começar pelo espaço errado, não podemos nos restringir a um único lugar de manifestação do sagrado. O Deus da transcendência e somente dela, é um ídolo criado pelas nossas projeções para legitimar nossos desejos megalomaníacos. O Deus da subjetividade e somente dela é um ídolo que manipulamos e reconstruimos ao sabor das nossas inclinações. E finalmente o Deus no outro e somente ele, criará um ídolo de múltiplas personalidades.
Quando os três espaços interagem na construção do conhecimento de Deus em nossa vida, estamos próximos à descoberta do Deus que emana das páginas das Escrituras Sagradas. Aliás, sem a mediação do Texto Sagrado, nossas conceituações de Deus sempre serão caricaturas da divindade.
Mas, mesmo que trilhemos o caminho adequado, tal conhecimento não será ainda uma Boa Notícia que tenha o poder de dar sentido à nossa existência errante. Essa Boa Nova só será libertária se nos confrontar com a pessoa de Jesus de Nazaré. Ele é a concreção do Deus em nós, conosco e por nós. Jesus é Deus traspassando a soleira da porta que separa tempo e eternidade, invadindo nossa história e religando-nos à nossa fonte originária. Nas palavras do Texto Sagrado seria ditto: “Jesus é o alfa e o omega, o princípio e o fim, o que era, o que é e o que há de vir.”
AFA Neto
segunda-feira, 5 de setembro de 2011
MENTIRAS “VERDADEIRIZADAS”
Quando as cadeias não são palpáveis a
libertação se torna mais complicada. Prisões ideológicas e religiosas são mais
resistentes porque dão a impressão de que são boas. São algemas disfarçadas em
belos braceletes que embelezam a vida de quem as usa. São mentiras entranhadas
em nós que, acabam por ganhar o status de verdade eterna e absoluta. Temos um
bem enorme a elas, pois organizamos toda a nossa vida em função delas. O mundo
passa a ser visto sob a perspectiva dessas mentiras “verdadeirizadas”. As pessoas passam a ser julgadas, condenadas ou
adsolvidas, em função desses conceitos.
A
armadilha do sucesso material e individual tem pegado muita gente pela vida a
fora. E quando esse ideal vem com uma legitimação religiosa, então fica quase
irresistível. Miserável ser humano que não conseguiu acesso ao céu criado aqui
na terra por engenheiros de uma espiritualidade vitoriosa. Saúde, bem estar,
dinheiro, poder; o Paraiso está ao alcance de uns poucos afortunados. A maioria
tem de conviver com a pobreza, as doenças e a condição subalterna, na esperança
de que algum dia elas consigam se livrar dessas maldições e alcançarem a
beatitude aqui e agora.
“Todo dia ela faz tudo sempre igual, me
sacode às 6h da manhã…” e então a vida começa para milhões de homens e mulheres.
Transporte coletivo de péssima qualidade, trajetos cada vez mais longos e
demorados. Rotina estressante de trabalho com péssima alimentação e nenhum
descanso. É bom torcer para a saúde não apresentar sinais de mal funcionamento,
pois se isso acontecer, o serviço disponível é de péssima qualidade. O jeito é
fazer horas extras para garantir uma graninha a mais para tomar aquele goró com
a rapaziada no fim de semana. A familia vai ficando mais distante e aí o
roteiro já é largamente conhecido.
Em meio a
todo esse drama, eis que surge uma luz! Vou procurar uma igreja. Lá se descobre
que sua pobreza é maldição por pecados seus e de seus antepassados. Lá, irá
descobrir que as doenças que você e sua família contrairam certamente tem
causas espirituais. Mas não se desespere; haverá uma solução simples e rápida para isso, basta
cumprir o roteiro proposto de compras de souvenirs
e observâncias de regras. Eis, que depois de tudo isso voce descobre que nada
funcionou. Aí terá que ouvir do sacerdote que o problema está em sua falta de fé,
afinal funciona para todos. O que não foi dito é que esse “todos” na verdade se resume a pessoas selecionadas para aparecer
na TV e nos púlpitos dos grandes eventos, como chamariz para atrair
desesperados. “Todo dia é o mesmo dia, a
vida é tão tacanha. Nada novo sob o sol.”
Ao final,
você estará pobre, doente, só e serviçal e descobrirá que tudo isso é assim por
incompetência sua. Lhe restarão duas alternativas: ou você mergulha de vez numa
auto-culpa tirânica ou se auto-vitimará transferindo a culpa para Deus. Talvez
chegue ao fim da sua vida sem nunca ter pensado que tudo isso pode ter sido
causado por gente inescrupulosa que se deu muito bem às suas custas. Que tudo
aconteceu porque um sistema perverso foi instaurado para sugar da maioria o que
uma minoria iria usufruir e você nunca contestou esse sistema. E, finalmente,
que tudo só foi possível porque muitas mentiras “verdadeirizadas” foram acolhidas por você , que passou toda a vida
julgando pessoas e a si próprio com base nelas.
AFA Neto
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