Já houve época em minha vida em que pensava a oração com um espírito de sindicalista fazendo piquete na porta da fábrica. Deus era o patrão do qual tínhamos que arrancar direitos sonegados. Como patrão não conhece outra linguagem senão a da pressão, imaginava a oração como instrumento para pressionar Deus a conceder-me aquilo que pensava merecer. Quanto maior a insistência menor a resistência dEle. E no final, sem alternativas, o jeito era ceder aos reclames dos “piedosos” grevistas da fé.
O slogan era (e ainda é em alguns círculos): muita oração muito poder, pouca oração pouco poder. Depois de longas sessões de oração, me erguia com a sensação de que sob a minha palavra o mais encardido dos demônios imploraria por misericórdia diante de mim. Ninguém poderia me resistir. Orava para me encher de poder e me enchia de outras coisas como vaidade, arrogância, orgulho, soberba e prepotência. Quase sempre me ajoelhava para orar, mas mesmo antes de me levantar olhava as pessoas e o mundo de cima para baixo.
Alguma coisa estava errada. Os campeões da oração tanto nas páginas sagradas quanto na história da igreja seguiram itinerário completamente diferente do meu. Quanto mais oravam mais insignificantes se sentiam, mais dependentes de Deus se tornavam, mais destituídos de poder se viam. Quanto maior o tempo em oração maior o amor que sentiam pelo próximo, maior a compaixão que manifestavam em seus gestos, maior o desejo de se doar.
Hoje eu oro como quem se assenta ao redor de um fogão a lenha em companhia de gente querida, amiga e íntima. Não penso no que será depois e nem nos famigerados resultados da oração. Quem se encontra entre amigos, comendo uma comida gostosa e em lugar acolhedor, só pensa em eternizar aquele momento. O importante é desfrutar da presença sem medir as palavras e sem temor de ser mal interpretado. É comentar sobre os gostos e cheiros, sobre os planos e temores. É sentir-se em liberdade para sorrir e chorar, para manifestar seu cansaço em relação às coisas desta vida e suplicar por renovação da esperança.
Quem ora para obter mercantiliza a relação com Deus. A oração como meio gera fadiga e frustração, pois logo logo descobrimos que Deus não existe para satisfazer nossos caprichos. Sei que Deus age todo o tempo nos agraciando com bênçãos, mas não consigo me empolgar com esses testemunhos de “respostas” de oração. Oração não é veículo para obtenção de benesses, oração é um lugar onde nos encontramos com Deus e conversamos descontraidamente, sem pauta e sem uma lista de demandas para serem atendidas.
Na oração não ha antes e nem depois, só há a PRESENÇA. E ela é suficiente.
AFA Neto
Poxa Pastor, como tem tanta gente enganada em relação a oração.Estas verdades profundas precisam ser espalhadas entre os crentes. Nosso coração egoísta e interesseiro precisa se libertar desta prática tão enraizada na mente, de que Deus tem certas obrigações para conosco e de que nós somos "filhos do Rei" e por isto temos o "direito" de receber dele todas as bençãos possíveis. Que o Espírito Santo transforme nosso superficial modo de ORAR.
Alessandra Cunha.
Muuuuuuuuuito bom, muito bom mesmo...
Querido pastor,
Também, ao longo de minha vida, cometi equívocos assim (e não duvido de ainda, sem perceber, cometê-los...). E me alegro em saber que orar é muito mais prazeroso quando é franca, profunda e desprentenciosamente um aconchego junto a Deus. Ainda que haja súplicas, pedidos e necessidades, mais que haja sempre o prazer e a alegria de simplesmente estar com o Pai. Um abração
Rosana Dourado
É exatamente isso Rosana. Não é que não deva conter pedidos e súplicas; mas essas coisas precisam ser pensadas e ditas num contexto de desfrute da presença de Deus.
Alessandra, ainda existe muito engano com respeito à oração em nossas igrejas, mas quero crer que aos poucos as coisas serão esclarecidas.
Grande Tarcisio, valeu pelo incentivo.
Abração a todos
Pastor,
Isso me faz lembrar das "orações fortes" que certas igrejas dizem fazer, induzindo à ideia de que alguns crentes pudessem ser Power Rangers da fé... Amei seu texto!
Grande Neto,
Mais uma vez sou abençoado através de sua reflexão.Tenho encontrado irmãos queridos que estão cansados do convívio com os pretensiosos da oração reivindicatória "quero de volta o que é meu". Amo de paixão a conversa ao redor do fogão de lenha, em Minas Gerais ainda é possível esta pratica, por isso sei bem do que você está falando. O papo ao redor do fogão é longo e prazeroso, é livre, pois é democrático. É aconchegante, pois só se fica muito tempo ao redor do fogão com os mais chegados, pois as visitas recebemos na sala (Rubem Alves???). Enfim, ao redor do fogão a conversa boa continua dias depois, como se o tempo não tivesse passado.
Obrigado amigão,
Nando
Querido Neto,
Reflexões como esta certamente nos conduzem ao amadurecimento cristão. De fato, como aprendemos desde crianças na Escola Dominical: orar é conversar com Deus. Lembrando-nos, ainda, que Jesus nos chama de amigos.
Um abraço fraterno.
Cledinaldo