Recursos demais para pouca capacidade de explorá-los. É assim que nos encontramos diante de um mundo tecnológico. Cada dia é lançada uma versão nova de um produto que, desde a primeira versão, já não sabíamos explorar todos os recursos. Celulares que acessam a net, baixam programas, tiram fotos com qualidade semelhante às maquinas fotográficas digitais, tem memória de sobra para guardar arquivos de texto, áudio e vídeo, tem dispositivo para identificar músicas e compositores (track ID), tem jogos, etc. Ah, Também falam!
Nessa loucura nos encontramos diante de vários comportamentos novos: compramos um produto muito mais pelos recursos que disponibiliza, ainda que nunca cheguemos a usá-los, do que pela sua utilidade.
Mas, não quero falar sobre as deformações mercadológicas, quaro insistir na relação entre recursos disponíveis e capacidade de explorá-los. A ciência afirma que nossa racionalidade é subutilizada. Usamos cerca de um décimo da nossa capacidade racional. Isso nos leva a pensar em um outro problema: a utilização errada de algo. Isso se dá quando usamos um determinado bem para executar tarefas para as quais ele, originalmente, não foi projetado. Desvirtuamos a intenção e caímos no desperdício. É como comprar um aparelho celular com mil e um recursos somente para ouvir música.
Pensei nessas coisas quando lia um texto da Sagrada Escritura que fala sobre os olhos. “São os olhos a lâmpada do corpo, de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo estará em luz; porém, se os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas”. Passei a refletir sobre recursos disponíveis e finalidade. Acho que não sabemos usar os olhos e quando o fazemos pervertemos sua função. Alguém já disse que os olhos são as janelas da alma. Aceito a metáfora; só gostaria de especificar em que sentido acredito nisso. Se essas janelas forem para deixar entrar ladrões da nossa alegria, a chuva que acoita nossa disposição para o bem e inunda nosso interior com amargura, é melhor fechá-las. Se essas janelas estiverem abertas para, por elas, saírem ruindades, a ira que enclausuramos no coração e deixamos crescer até se transformar num monstro que vomita ódio, é melhor trancá-las.
Olhos são instrumentos para perceber a beleza do que Deus criou. Com eles eu miro o meu semelhante e descubro as coisas boas escondidas por detrás da crosta de maldades que se agarrou a ele no decorrer do tempo. Olhos são recursos destinados a ver a dimensão estética do corpo sem incorrer na tentação de coisificá-lo, transformando-o em mero objeto de desejo sexual. Com os olhos eu me excito com os movimentos da mulher que escolhi para partilhar seduções e vencer desafios. Pelo olhar me entristeço com a desfiguração de uma criança que é só pele e osso nos braços de sua mão de seio mirrado.
Não fecho meus olhos para políticos desonestos e aproveitadores, para sacerdotes picaretas e alienados, para burgueses desalmados e egoístas, para religiosos legalistas, para fundamentalistas assassinos, para a piedade dissimulada e para a racionalidade incoerente. Recuso-me a usar meus olhos para bisbilhotar a vida alheia, escandalizar-me com comportamentos diferentes dos meus, alimentar meus preconceitos e chafurdar-me no pessimismo. Isso é desperdício e perversão de função.
AFA Neto
Na maioria dos vertebrados, a função do olho é permitir que a luz se projete em um painel sensível à luz, conhecido como retina, onde a luz é detectada e convertida em sinais elétricos. No ser humano percebo uma particularidade interessante e tenebrosa. A capacidade de permitir que trevas se projete em um painel de cobiça e desejo ardente, conhecido como concupiscência.
Que DEUS nos livre da perverção de função;
Um grande abraço Pastor Neto.
Grande Dadau, sua percepção é fantástica e oportuna.
Abração
Se usarmos os olhos e, como disse, só usarmos 1 décimo da nossa racionalidade, e ainda assim, para as coisas desvirtuosas estaremos perdidos, mas usando-os e percebendo, fazendo uma análise mais profunda isso sim fará de nós bons' usuários' da máquina visual.